Moravam na mesma casa dois gatos iguaizinhos
no pelo, mas desiguais na sorte. Um, mimado pela dona, dormia em
almofadões. O outro, no borralho.
Um passava a leite e comia no colo. O outro, por feliz se dava com as
espinhas de peixe do lixo.
Certa vez, cruzaram-se no telhado e o bichano de luxo arrepiou-se todo, dizendo:
- Passa ao largo, vagabundo! Não vês que és pobre e eu sou rico? Que
és gato de cozinha e eu sou gato de salão? Respeita-me, pois, e passa
ao largo...
- Alto lá, senhor orgulhoso! Lembra-te de que somos irmãos, criados no mesmo ninho.
- Sou nobre. Sou mais que tu!
- Em quê? Não mias como eu?
- Mio.
- Não tens rabo como eu?
- Tenho.
- Não caças ratos como eu?
- Caço.
- Não comes rato como eu?
- Como.
- Logo, não passas dum simples gato igual a mim. Abaixa, pois a
crista desse orgulho e lembra-te que mais nobreza do que eu não tens - o
que tens é apenas um bocado mais de sorte...
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